«Sou barbeiro. É uma coisa que pode acontecer a qualquer pessoa. Até me atrevo a dizer que sou um bom barbeiro. Cada um tem as suas manias. Eu cá não gosto de borbulhas. Aconteceu assim: comecei a barbeá-lo calmamente, ensaboei-o com habilidade, afiei a navalha no assentador e suavizei-a na palma da mão. Sou um bom barbeiro! Nunca cortei ninguém e ainda por cima aquele tipo não tinha uma barba muito espessa. Mas tinha borbulhas. Devo reconhecer que nas suas borbulhas não havia nada de especial. No entanto, incomodavam-me, enervavam-me, faziam-me subir o sangue à cabeça. A primeira, contornei-a bem, sem grande dificuldade, mas a segunda começou a sangrar. Então, não sei o que me deu, mas acho que foi uma coisa natural, aprofundei a ferida e depois, sem poder deixar de o fazer, com um só golpe, cortei-lhe a cabeça.» Max Aub, Crimes Exemplares Edição: Antígona Tradução: Jorge Lima Alves