Da minha janela vejo o velho remexer no saco plástico. Sentado no banco de tábuas podres, retira um casaco quente. Abre-o, estende-o ao seu lado, nas costas do banco, observa-o como a uma mulher bela. Depois dobra-o e, por fim, acaricia-o com as mãos lentas e trémulas da velhice e da miséria. Volta a enfiá-lo no saco, atenta nos prédios em volta, nas pessoas que passam, sorrindo para as suas costas. A seguir levanta-se, de saco em punho, e começa a caminhar devagar. Detém-se na porta de um prédio. Vai entrar!, Vai entrar!, Entra!, Entra na tua casa! No entanto retoma o passo, arrastando as botas gastas. Segue o seu caminho, já vai longe, e reparo agora que quem sorri para as costas de alguém sou eu.