Do veneno do medo

«[...] 9457, crises, são apenas crises, 9500, o pai não consegue confiar no filho, nas palavras do filho, o pai só confia no que é capaz de criar a cada momento, mesmo que seja este medo de coisa inexplicável, 9660, na palidez da face do pai formam-se pequenas gotas de suor que o filho limpa enquanto garante que já falta pouco, 9780, o pai sente o coração acalmar na carne onde embate, o sangue abranda numa espécie de tranquilidade espessa, 9894, 9900, as crises vêm e vão, voltam cada vez mais depressa, 9958, vêm e vão, vêm e vão, demoram-se cada vez mais, 10 014, um dia será inútil contar, 10 049, o tempo desenrolar-se-á sem fim e não será possível escapar, 10 118, um dia, 10 134.»

Dulce Maria Cardoso, do conto «Pânico», incluido no volume Tudo São Histórias de Amor
Edição: Tinta da China