A ficção é vida inteira. Mas tal ilusão só existe na medida em que ela se substitui (ou se antagoniza) àquela que, de tão povoada de seres feios, não tem morada para a serena sabedoria.
« Um Pássaro no Arame , de Manuel Alberto Vieira, é um livro desconcertante — e o adjectivo não é aqui aplicado por ser sonante. Desconcerta, no verdadeiro sentido da palavra, esta narrativa de frases secas, curtas, simultaneamente descritivas da acção e reveladoras do labirinto que se guarda na cabeça de cada personagem. É uma narrativa estranha, porque essa secura o verbo contrasta intensamente com o que se vai revelando, mesmo que nada pareça acontecer (sobretudo aí, quando nada parece acontecer). Há uma linha cronológica e há personagens bem definidas, com uma caracterização psicológica extremamente minuciosa, que prescinde das grandes descrições de carácter e se forma pelo conjunto de gestos, indícios e pensamentos. Há acção e uma atenção ao detalhe com que esta se constrói, o texto sempre perseguindo os sinais, aquilo que se revela em cada movimento e em cada decisão das personagens. O que não há é uma estrutura que nos ampare enquanto lemos — e isso não é acidental, claro. A po