Eduardo Galeano (A linguagem)
A linguagem
«O Pai Primeiro dos guaranis ergueu-se na escuridão, iluminado pelos reflexos do seu próprio coração, e criou as chamas e a ténue neblina. Criou o amor, e não tinha a quem o dar, criou a linguagem, mas não tinha quem a escutasse.
Então encomendou às divindades que construíssem o mundo e que se encarregassem do fogo, do nevoeiro, da chuva e do vento. E entregou-lhes a música e as palavras do hino sagrado, para que dessem vida às mulheres e aos homens.
Assim o amor fez-se comunhão, a linguagem ganhou vida e o Pai Primeiro remiu a sua solidão. Ele acompanha os homens e as mulheres que caminham e cantam.
Já estamos pisando esta terra,
já estamos pisando esta terra reluzente.»
Eduardo Galeano, Memória do Fogo - Os Nascimentos
Edição: Livros de Areia
Tradução: António Marques