Não a uma morte anunciada

    As livrarias independentes estão a fechar. As que ainda resistem, limitam-se a esperar a morte anunciada - tristes, impotentes, mas que, com a coragem que a dignidade reivindica, se mantêm verticais no cadafalso. Nos rostos dessas livrarias cronometram-se os segundos até ao momento em que nada lhes valerá. Percebe-se-lhes a angustia em cada gesto, não é preciso estar muito atento.
    Tombam uma a uma, como peças de dominó em câmara lenta. A minha favorita fechou as portas recentemente, mas quero acreditar que o fez para se proteger desta poderosa contramão que varre tudo à sua frente. Por vezes, a cedência ao medo é o principal sinal de inteligência, e como não há mal que dure para sempre, quero também acreditar que os livros serão preservados nesse acolhedor bunker que um dia se abrirá para nos devolver o seu precioso e íntimo tesouro.
    Entretanto, permito-me ser ingénuo e encontrar conforto na paciência, solidária. Até porque quem perdeu por completo a ingenuidade, perdeu (pelo menos em parte) o seu lugar neste mundo.