Compreender a solidão

    Um dia recebeu a visita de um amigo que, intrigado, lhe perguntou:
    - Como te dás num espaço assim, tão fechado?
    Distraiu-se do quadro que pintava e, após um breve silêncio, respondeu:
    - Como não te dás num espaço assim, tão aberto?
    O filho, de orelha encostada à porta do atelier, a princípio sentiu-se um tanto confuso com a resposta do pai. Queria compreender, mas, em vez de pensar, continuou de orelha encostada à porta. 
    No entanto, nem mais uma palavra foi pronunciada. Era como se o atelier tivesse ficado vazio. Até que escutou um ruído. Passos, passos que se aproximavam. Afastou-se da porta e escondeu-se.
    O visitante saiu, cabisbaixo e contraído, como se sentisse vergonha. Com tristeza no rosto e fúria nos membros, encaminhou-se para o portão de acesso à rua.
    Espreitou o atelier, o pai olhou-o de soslaio.
    - O que queres?
    - Ficar um bocado no teu espaço fechado. Não me dou neste espaço aberto. Posso?  
    Não respondeu, e o filho, postado na soleira, pôs-se a observar aquele artista, aquele homem, aquele pai,  com o mágico enlevo da descoberta - e, mais importante, da comunhão.